terça-feira, 16 de abril de 2013

Inço, nada! É PUNC!

Pariparoba ou Caapeba: PUNC ornamental, alimentícia e medicinal

Por Geraldo Varjabedian 


Não, você não leu nem escrevi errado. Inço, para quem não sabe, é mato, erva espontânea, erva daninha. Trata-se, em jardinagem e paisagismo tradicionais, como estorvo... E PUNC é o quê? Nada a ver com o saudoso punk rock. O que está em pauta são Plantas de Uso Não Convencional... Há quem diga PANCs, Plantas Alimentícias Não Convencionais, mas como abordo outros usos além do alimentício: PUNCs... A cultura PUNC, não é Nova. Ao contrário, é uma revisita ao óbvio, como tudo que tange a sustentabilidade.

Em diversos lugares do mundo pessoas lutam para resgatar suas origens, sabedoria e empoderamento. O sistemático desrespeito à natureza como norma de desenvolvimento é, também, fruto da globalização que transformou todo o planeta em uma grande diáspora. A maioria das pessoas perdeu vínculos com suas raízes ancestrais  e culturas de origem. O preço? Uma crise de valores sem precedentes, inúmeros problemas de saúde inéditos, inclusive, problemas psicoafetivos e, no contraponto, um verdadeiro salve-se quem puder diante da lenta, mas constante queda das máscaras das corporações e instituições. Todos os dias anunciam-se sucesso ou ruína de uma substância da qual fomos ou seremos cobaias. Relativizamos a ética! No campo da saúde -- portanto, da alimentação -- há muita gente fechando os olhos para o que realmente importa, em nome da psicopatia vigente - a lógica de mercado.

Sabemos que aditivos químicos, conservantes, hormônios, antibióticos, vacinas, adubos, pesticidas e outras tantas substâncias fazem parte de vários alimentos disponíveis no mercado. O Estado sabe. A medicina oficial também sabe disso, como sabe dos males causados por essas substâncias nada naturais que compõem a dieta de tanta gente. Receitam medicamentos para males perfeitamente evitáveis com uma dieta equilibrada, mas nem todos alertam para os riscos e efeitos colaterais dos alimentos industrializados.

Enquanto isso, a grande mídia -- que também não se envolve eticamente na mudança alimentar -- se encarrega de "ensinar" a lógica do mercado. Ensina estatísticas, medicina, nutrição, até química, como se saber nomes e números quisesse dizer conhecimento; mas se você perguntar aos consumidores que compram o alfabeto de vitaminas à disposição; o que é uma vitamina?, raríssimos saberão responder. As pessoas aprendem os nomes das vitaminas, e repetem. Sabem porque lhes foi ensinado que vitamina tal serve para tanto e pronto. Lêem os rótulos à procura o que lhes foi ensinado. Nos supermercados, os alimentos trazem informações como valores nutricionais e dados sobre as substâncias utilizadas como ingredientes, mas nenhum deles diz: usamos veneno xis para que somente nossas espécies patenteadas sejam viáveis; para produzir isto mais rápido; para que aguente mais tempo no transporte ou no estoque, ou para parecer mais bonito aos seus olhos facilmente ludibriáveis de consumidor. Não, essa informação não aparece. O que aparece é o marqueting. E nas espécies vegetais a granel? Não aparece nada! Nem valores nutricionais, nem o apelido do agrotóxico utilizado, nem de quem era a semente. Nada sabemos sobre os alimentos que consumimos e o que sabíamos sobre alimentos in natura está sendo destruído pela cultura de massas. Nossos sentidos foram corrompidos. A maioria sobrevive sem medicina alguma além do que o mercado e a mídia impõem como bem e bom sem, é claro, revelar a quantas anda o consumo de agrotóxicos e congêneres ou as doenças decorrentes dessas maravilhas químicas que invadiram o ato mais trivial da humanidade: alimentar-se!

Em oficinas, as pessoas perguntam - Há como retirar os agrotóxicos, lavar, escovar, diluir, neutralizar? Apesar do otimismo, e de todas as receitas conhecidas, entendo que não existe uma maneira completa e segura de eliminar os agrotóxicos dos alimentos in natura, a não ser que sejam produzidos sem esses venenos... A precária exceção a tudo isso -- os fabulosos orgânicos -- já foi absorvida pelo mercado. Claro que há uma infinidade de pequenos produtores que insistem em seguir preceitos ecológicos, sustentáveis, mas também encontramos orgânicos embalados, maquiados e rotulados, e até transgênicos orgânicos produzidos em mega escala que o consumidor, sempre de boa fé, compra, certo que está salvando a si mesmo e ao mundo.

 O consumo de vegetais in natura ainda é uma excentricidade para a maioria das pessoas e o conhecimento ancestral dos alimentos vem se perdendo na "praticidade" do dia-a-dia, no consumismo, na ilusão de que o poder de compra garante saúde.

No entanto, uma onda sustentável de alegria e amor está apontando uma tendência em todo o mundo: muita gente questiona o modelo alimentar urbano e retoma o hábito de cultivar em casa ou, simplesmente, compra direto de pequenos produtores... Há pessoas plantando nos telhados, nas calçadas, nas sacadas. De um pé de manjericão na janela do kitchinete às praças públicas, da organização de cooperativas de consumo a feiras públicas de trocas de sementes e mudas, essas pessoas mostram que querem mesmo saúde e sustentabilidade.

Se você já percebeu o quanto o paisagismo convencional é inerte e caro -- ,além de não valorizar a natureza de fato -- uma boa ideia é transformar seu jardim careta num jardim comestível. Qualquer punhado de terra produz comida. E qualquer comida plantada é como fazer brotar dinheiro do chão. Isso significa não apenas economia, mas uma relação mais sensata entre você e sua alimentação, sua saúde e a utilidade do espaço pelo qual você paga, inclusive, impostos. Por falar em impostos, você já se perguntou por que o poder público, que fala tanto em sustentabilidade, não estimula o plantio de espécies medicinais e alimentícias? Por que não utiliza os espaços públicos para promover e difundir esse conhecimento?... Tudo bem, enquanto isso não acontece você pode fazer em casa. Não precisa abrir mão de suas flores e samambaias, mas pode produzir parte de seus alimentos, temperos, chás; reequilibrar-se em contato com a terra e, certamente, ganhar em saúde...

Mas onde entram as PUNCs nisso tudo? Explico - No mercado, você vai encontrar pacotes de sementes beneficiadas e tratadas para plantio. Muitas delas, transgênicas ou produzidas pelos mesmos métodos do agronegócio. Em lojas especializadas, também terá informações de sobra sobre como preparar a terra, comprar terra pronta, adubo específico para cada espécie e uma série de outras possibilidades. Adianto que será inevitável algum investimento em sua horta, caso queira algo convencional... Mas, se quiser plantas que quase não dão trabalho, apresento-lhe as PUNCs. Espécies comestíveis ou medicinais encontradas em terrenos baldios, barrancos, calçadas ou beiras de estrada. Aparecem espontaneamente e de forma abundante, até nos jardins, mas a incultura imposta pela urbanização aponta para elas dizendo - É mato! É inço! É erva daninha! Limpe! Arranque! Borrife mata-mato!...Um olhar mais detido, sustentável e amoroso mostra que, além da beleza intrínseca, são espécies muito bem adaptadas, vitais, versáteis e resistentes, além de nutritivas e absolutamente isentas de manipulação genética ou química. Não demandam solo especial, não precisam de adubo e a maioria delas se contenta com a rega das chuvas e produz muito! Algumas são conhecidas da medicina caseira. Outras, de uso alimentar, foram aposentadas pelo mercado porque fogem às convenções importadas de praticidade, aparência ou mimos do paladar... É o caso da Pariparoba ou Caapeba, por exemplo. Uma planta utilizada para males estomacais e hepáticos, de alto poder antioxidante e cicatrizante, e de cuja raiz se faz um chá tradicional para ressaca e males do fígado. A Pariparoba (folhas)  pode ser usada em qualquer suco verde ou salada. É uma tremenda fonte de clorofila. Pode virar "wrap". Pode ser refogada. Pode até ser consumida ao natural como a couve ou outra folhagem. Nutritiva, essa espécie originária da Mata Atlântica é comum em toda a baixada santista. Outra, muito comum, é a taioba, abundante em toda a Mata Atlântica. Rende excelentes refogados, lasanhas verdes, risotos, bolinhos, farofas... Mais espécies? Serralha, Dente de Leão, Capuchinha, Ora Pro Nobis, Tansagem, Bredo, Feijão de Corda, Vinagreira ou Caruru, Assa-Peixe; frutos como o Gravatá, o Cambuci, o Jambo, o Jambolão, o coquinho e o palmito da Brejaúva, Palmito de Taboa, Rabo de Gato (Pólen), Lírio do Brejo (Gengibre), além de flores comestíveis e outros... A lista é longa !   
                                             
Especialmente para os que já despertaram para o valor da clorofila, lembro que, além de verduras, sementes e gramas germinadas uma excelente opção são folhas de algumas frutíferas como mangueira, goiabeira, serigueleira, pitangueira... E folhas da batata doce, do chuchu, da abóbora -- suas flores, inclusive. Sempre sem exageros e não exclusivamente. Misture-as com outras folhas porque em pequenas quantidades não oferecem risco algum.               Para dar conta do mundo que vem aí é preciso resgatar sabedorias que o mercado soterrou com valores que nem sempre são os seus. Muitas vezes, o coração diz que sim e logo aparece um olhar oficial dizendo que não, mas há muito conhecimento sobre PUNCs que a mídia em geral não veicula, ainda que inúmeras universidades, cientistas acadêmicos e mesmo autodidatas estejam pesquisando usos, inclusive, como forma de diversificar o mercado.

Atenção: os cuidados tradicionais de higienização para o consumo, bem como identificação e utilização rotineira de espécies medicinais como alimento demandam algum conhecimento. Inicie as pesquisas aos poucos, identifique as espécies, troque informações e mudas com pessoas de seu relacionamento e confiança porque, mesmo na internet, ainda há poucas informações a respeito, e como tudo que visa uma transformação real rumo à sustentabilidade, não tem marqueting pronto e não é divulgado. 


Geraldo Varjabedian é escritor, terapeuta holístico. Voluntário da Agenda 21, especificamente, no capitulo 4 - Mudança dos Padrões de Consumo. Facilita oficinas de alimentação sustentável, consumo crítico e outras. Contato e agendamento de oficinas : ge.varja@gmail.com

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